JUNHO 2013
PERDAS DE AUDIçãO
Existem várias doenças que podem levar à perda de audição, pelo que é importante, em cada caso, tratar a origem do problema e não apenas os sintomas, defende em entrevista o Dr. Fernando Neves, médico otorrinolaringologista, alertando para os riscos de adoptar qualquer tratamento sem acompanhamento médico.

Que tipos de perda auditiva existem?
Em termos gerais, podemos dizer que existe a perda de audição por transmissão do som, que ocorre devido à falha do mecanismo de transmissão, e depois temos a chamada perda de audição de origem central, que se deve a problemas mais complexos, nomeadamente a nível cerebral, ou da condução do som ao nível do ouvido interno. Portanto, são patologias díspares, com um tratamento e abordagem completamente diferentes e cujo diagnóstico só se consegue fazer quando fazemos as perguntas correctas e depois observamos o paciente e pedimos para fazer os exames que estão indicados para cada caso. O fundamental é fazer o diagnóstico, saber o porquê de a pessoa ouvir mal e ir ao cerne da questão, ou seja, não tratar o sintoma, mas sim a doença. Há perdas de audição que são porventura mais “fáceis” de tratar, nomeadamente as relacionadas com a falha do mecanismo de transmissão, em que podemos recorrer, ou não, a métodos cirúrgicos. Já nas perdas auditivas de origem central, o tratamento na maior parte das vezes é mais difícil, sendo que também poderá ser médico-cirúrgico, mas envolvendo um tratamento mais complexo e com resultados não tão positivos, embora muitas vezes se consiga uma melhoria razoável mesmo neste tipo de surdez.

Quais são as doenças mais comuns que podem levar à perda da audição?
Em relação à doença da transmissão do som, pode ter muitas causas, como por exemplo: uma infecção; um traumatismo; um simples rolhão de cerúmen, ou seja de cera acumulada no canal externo, que não deixa o som chegar à membrana do tímpano; um derrame no ouvido médio, que é muito frequente na criança, etc… Em todos estes casos, estamos a falar de uma patologia relacionada com a chegada do som e com a vibração de uma membrana chamada tímpano. A doença pode ter muitas causas, mas mais que informar sobre os aspectos técnicos, o fundamental é transmitir às pessoas o que devem fazer. A maioria dos casos mal tratados, que poderiam ter uma percentagem de cura maior, ou um tempo de sofrimento menor, depende de três factores: uma má informação; o descuido ou desleixo do cidadão; ou então por má prática das pessoas que se debruçam sobre a patologia da audição.

Como se distribuem as doenças auditivas pelos diferentes grupos etários?
Podemos falar de perdas de audição no recém-nascido, no jovem e no adulto. No caso do recém-nascido, há várias patologias que podem acontecer, incluindo em alguns casos problemas graves e delicados, implicando cirurgias que, quando mais cedo forem feitas, melhor para a criança. No entanto, sublinho que hoje em dia, contrariamente ao que era comum em gerações anteriores, as crianças costumam nascer no hospital ou numa clínica, pelo que são sempre vistas por um pediatra e, havendo suspeita de algum problema, o especialista vai orientar no caminho certo. Este acompanhamento médico é muito importante, pois estamos a falar de situações graves e quanto mais cedo se fizer o diagnóstico, maiores probabilidades existirão de recuperação do paciente.

Nos jovens, como se caracteriza a surdez?
Esta é, normalmente, uma surdez de transmissão. Podemos estar a falar da criança que muitas vezes ressona, ou a quem dói frequentemente o ouvido, com ou sem otite, purgando ou não do ouvido: estamos perante uma patologia do foro infecto-contagioso. Muitas vezes, a criança ouve mal, mas está ou com hipertrofia das adenóides, ou com rinite alérgica, ou com uma permeabilização do canal que faz comunicação entre o nariz e o ouvido (Trompa de Eustáquio). O que é importante é que os pais estejam atentos e saibam reconhecer os sinais de alarme, por exemplo: reparam que a criança se põe muito perto da televisão para ver os desenhos animados; fala demasiado alto; é uma criança muito irrequieta, que nunca pára; quando vai para a escola, os professores – seja na pré-primária, seja já na primária – reclamam que é uma criança difícil, que tem fraco rendimento escolar, ou então que tem um comportamento agressivo… Tantas vezes, quando estamos perante estes sinais, a criança tem um problema de audição e os pais por vezes não reparam, pelo que é importante pecar sempre por excesso e não por defeito: havendo a suspeita que de algo está mal, os pais devem levar imediatamente a criança a consultar um médico, de modo a que seja encaminhada para o tratamento correcto e tenha uma melhor qualidade de vida. Tudo aquilo que faz com que a criança ouça mal ou que tenha infecções de repetição, deve fazer com que os pais, pelo menos, suspeitem de algo. Muitas vezes, depois de a criança ser tratada, o rendimento escolar sobe, esta passa a ser dócil e deixa de ter problemas de comportamento, que até poderiam estar a afectar a relação com os pais ou com os irmãos. É fundamental divulgar esta informação para bem das crianças, dos pais e da própria sociedade, pois se estes problemas são resolvidos atempadamente, estas crianças vão ter um desenvolvimento melhor, fazendo com que, mais tarde na vida, sejam adultos mais capazes nas diversas áreas.

E em relação ao adulto?
O adulto pode sofrer as consequências de um tratamento deficiente quando ainda era criança, mas há também patologia chamada “do adulto” e dentro desta, podemos dizer que temos a patologia do adulto activo e depois temos a patologia do indivíduo de terceira idade. O grande problema da velhice, é que mentalmente continuamos a ser jovens: a partir de determinada idade, dos 50 ou 60 anos, as pessoas sonham e querem fazer as mesmas actividades que faziam aos 20 e aos 30 anos, só que o sistema locomotor, as articulações, o joelho, o ombro, não deixam… É evidente que o envelhecimento se verifica não só ao nível da locomoção, mas também ao nível de todos os órgãos e sentidos, incluindo a audição. Agora, é importante termos em conta que, um doente que tem perda de audição, muitas vezes tem associados problemas que são muito mais graves. Por exemplo, quando os doentes têm um zumbido que não os deixa dormir, é mais importante resolver o problema do zumbido que o da perda de audição associada. Ou então, quando as pessoas me dizem que ouvem mal e têm caído muito porque se desequilibram, é preciso resolver o problema no ouvido interno, que está a provocar tanto as perdas auditivas como as perdas de equilíbrio. Em qualquer caso envolvendo um paciente adulto, com ou sem história de patologia do ouvido, é preciso interrogar e observar bem. Fico muito preocupado, quando chegam doentes que me dizem: “eu só vim aqui para me receitar os aparelhos que já comprei”, para terem acesso à comparticipação…

Porque acha que isso acontece?
Penso que está intimamente relacionado com a publicidade que tem sido feita nos diferentes meios de comunicação social, convidando os cidadãos a dirigirem às casas que vendem aparelhos para melhorar a audição, e que tem sido estranhamente aliciante. O problema é que, quando as pessoas vão a essas casas, os técnicos são competentes para fazer um exame e ver que tipo de perda de audição as pessoas têm (por exemplo se têm cera ou não), mas ficam-se por aí, e depois receitam o aparelho. O que é criticável é que essas pessoas não têm conhecimento para saber se, por detrás dessa situação, existe por exemplo um tumor ou qualquer outra patologia grave. Quem faz o diagnóstico da situação deve interrogar-se porque é que a pessoa está com aqueles problemas de audição, ou seja, a questão não é fazer o exame e verificar se o indivíduo tem 30% ou 40% de perda de audição, mas sim, conseguir saber porque é que ele tem essa perda! Só um médico especialista é que pode ajuizar e fazer o diagnóstico correcto, indicando ao doente se precisa ou não de próteses auditivas, ou se precisa de ser operado ou de fazer um tratamento. E muitas vezes, a situação é multi-factorial e ultrapassa o otorrinolaringologista, pelo que é preciso consultar o neurologista, o neurocirurgião, ou o oftalmologista, de maneira a conseguir encontrar a explicação para o doente ter aquela patologia, ao invés de ficarmos pelo sintoma. 

A população precisa de estar melhor informada?
Eu traçaria um paralelismo com a visão, pois a audição e a visão são dois órgãos muito importantes no nosso dia-a-dia. Antigamente, lembro-me que os meus avós iam directamente à casa dos óculos para comprar uns óculos, de forma a tentar ver melhor, porque havia poucos médicos especialistas. Acho que hoje em dia, a percentagem de pessoas que faz isto é ínfima: quando as pessoas têm problemas de visão vão ao oftalmologista e o médico faz um diagnóstico da situação, cuja solução tanto poderá passar pelo doente usar óculos, como por não usar. A mesma coisa tem de passar a acontecer em relação à audição: até porque as próteses auditivas não são coisa barata, antes de comprar um destes aparelhos, as pessoas devem consultar o médico, aconselhar-se e saber qual é o tratamento que lhes pode trazer uma mais-valia. E o médico tem de saber explicar muito bem as coisas ao paciente, porque muitas vezes, associados à audição, há outros sinais e sintomas de doenças que têm de ser tratadas, porque senão o doente não consegue ir buscar toda a vantagem do tratamento, seja do aparelho ou da cirurgia.


 


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