SETEMBRO 2011
CIRURGIA BARIáTRICA
A cirurgia bariátrica destina-se aos pacientes com obesidade mórbida, fornecendo uma hipótese de perder peso e de reduzir os graves riscos associados a esta condição. O Dr. Celso Almeida e Silva, médico cirurgião, fala em entrevista dos procedimentos disponíveis e de como os mesmos podem melhorar a qualidade de vida dos pacientes.  

Em que consiste a cirurgia bariátrica?
Esta é a cirurgia da obesidade mórbida, sendo que, de acordo com as linhas orientadoras do “National Institute of Health” dos Estados Unidos, que saíram da reunião realizada na cidade de Bethesda, em 1991, a obesidade mórbida verifica-se quando o indivíduo tem um índice de massa corporal (IMC) de mais de 40kg por m2, ou 35kg por m2 associado a co-morbilidades, como por exemplo a diabetes, a doença cardíaca, osteoartroses, hipertensão, até mesmo problemas psicológicos ao nível da auto-estima: quando a pessoa se sente mal relativamente à imagem que projecta perante a sociedade, isso também é considerado uma co-morbilidade.

Que cirurgias estão disponíveis actualmente?
Na história da evolução da cirurgia da obesidade houve várias cirurgias, mas hoje em dia, podemos dizer que se fazem, fundamentalmente, quatro cirurgias, nomeadamente: a gastrobandoplastia, que consiste na colocação de uma banda no estômago; depois temos o “bypass” gástrico, que consiste numa redução do estômago para entre 15cm3 a 25cm3, acompanhado de uma derivação, ou seja, liga-se esta bolsa gástrica reduzida a cerca de 1,5 metros da parte terminal do intestino delgado, pelo que o paciente fica com uma menor superfície do intestino para fazer a absorção dos alimentos (estes já não passam pela parte inicial do intestino, que mede outros cerca de 2 metros). No “bypass” gástrico, a bolsa gástrica que se cria não inclui o fundo gástrico, que se situa na parte superior do estômago, onde se produz a grelina, uma hormona que aumenta o apetite. A pessoa passa a comer menos quantidade e fica logo farta, devido ao tamanho reduzido da sua bolsa gástrica. Uma vez que os alimentos não contactam com a grelina, o indivíduo tem uma sensação de saciedade precoce: come pouco e não sofre com fome. Convém esclarecer que não é feita a excisão de nenhuma parte do estômago nem do intestino delgado: eles ficam no organismo, mas já não intervêm no processo, daí o uso da expressão “bypass”, ou derivação, Uma outra cirurgia de redução gástrica é a gastrectomia em manga (“sleeve gastrectomy” em inglês). Nesta técnica, é retirada a maior parte do estômago, incluindo o fundo gástrico, e fica só uma “manga”. No intestino delgado produzem-se outras hormonas que têm actividade anti-grelina, ou seja, que aumentam a saciedade, nomeadamente a GLP1 e o PYY. Por fim, temos a derivação bilio-pancreática, que tem duas cirurgias possíveis: a operação de scopinaro, que hoje em dia já não se usa, e ainda o “duodenal switch”. Nesta última intervenção, a zona de absorção do intestino delgado fica com cerca de 1 metro, ainda menor que no caso do “bypass” gástrico. A gastrobandoplastia é a única destas operações que é possível reverter, as outras têm um carácter definitivo.

Entre estas cirurgias, quais são usadas mais frequentemente?
Hoje em dia, as cirurgias mais comuns são o “bypass” gástrico e a gastrectomia em manga. A gastrobandoplastia normalmente está reservada para casos muito especiais, porque a redução de peso, para ser eficaz, tem de ser superior a 50 por cento do excesso de peso. Vamos tomar o exemplo de uma pessoa que mede 1,70m de altura e pesa 270kg. O peso ideal desta pessoa, tendo em conta a sua altura, andaria por volta dos 70 kg, pelo que ela tem um excesso de peso na ordem dos 200kg. Para a cirurgia ser considerada eficaz, esta pessoa tem de perder mais de 100kg. A gastrobandoplastia consegue levar a uma perda de mais de 50 por cento do peso em excesso no início, mas depois a banda deteriora-se e perde efectividade. Em alguns casos, optamos por fazer primeiro a gastrectomia em manga e depois de o indivíduo perder algum peso, fazemos uma segunda operação para transformar num “bypass” gástrico, isto porque esta última é uma cirurgia mais agressiva. Um indivíduo com obesidade mórbida tem uma imunidade diminuída, por norma tem problemas cardíacos e muitas outras complicações, como infecções, desgarros, etc. Nos chamados super-super-obesos, ou seja, indivíduos que têm um IMC superior a 70 por cento, esta foi a maneira encontrada para diminuir estes riscos. Muitas vezes, é colocado primeiro um balão intra-gástrico, que depois vai ser retirado ao fim de seis meses, fazendo-se depois a gastrectomia em manga, que normalmente já leva a redução de peso e faz com que o doente melhore a vários níveis, por exemplo com a diminuição do fígado, antes do último passo que é o “bypass” gástrico. A cirurgia da obesidade mórbida teve um grande desenvolvimento após a aplicação da laparoscopia: esta é uma cirurgia mini-invasiva, que é feita através de pequenas incisões, com o auxílio de uma câmara minúscula e de um monitor. Após a aplicação da laparoscopia, a mortalidade diminuiu para menos de 1 por cento.

Antes de decidir pela cirurgia, o médico estuda outras hipóteses?
Hoje em dia, sabemos que 95 por cento das pessoas que fazem apenas dieta, ou então dieta conjugada com exercício, acabam por aumentar novamente de peso. Chama-se a isto o “fenómeno ioiô”. A pessoa que faz dieta e exercício perde peso, mas eventualmente cansa-se das dietas, e entretanto continua a sentir fome, porque continua em acção o fundo gástrico, produtor de grelina. Começa a comer como comia antes e o resultado, normalmente, é que chega a ficar com mais peso do que tinha no início. O programa de televisão Peso Pesado, que é muito popular, é de certo modo, uma “farsa”. Ou seja, é bom que incentive os espectadores a fazer exercício e a ser mais saudáveis, mas é errado que, na esmagadora maioria dos casos, uma pessoa que tenha obesidade mórbida tenha ali a solução para o seu problema.

O que é possível fazer em termos de prevenção?
Temos de investir na mudança de comportamentos, porque vivemos numa sociedade sedentária e esta mudança tem de começar na infância. No Reino Unido, por exemplo, já existem programas para as crianças com idades entre os 0 e os 5 anos fazerem actividade física. A mudança de comportamentos tem a ver com a dieta, o exercício físico vigoroso e o combate à publicidade enganosa no que se refere aos produtos alimentares. Depois, há outras medidas que podemos adoptar, como a colocação de parques de estacionamento longe do trabalho, para obrigar as pessoas a caminhar, ou a utilização de escadas em vez de elevadores. Das 24 horas do dia, temos de passar 8 a dormir, por numa necessidade fisiológica. Mesmo para as pessoas que estão motivadas para fazer exercício e passam 2 horas por dia no ginásio, “sobram” 14 horas, ou seja, a maior parte. É preciso ocupar estas horas com actividades que exijam que as pessoas se mexam: que caminhem, que usem escadas, que trabalhem de pé, ao invés de estar sentados permanentemente no trabalho, por exemplo. Em casa, que evitem passar o tempo sentados à frente da televisão, com o controlo remoto na mão… A escola também é um factor de sedentarismo muito grande, da maneira que normalmente funciona, com os alunos a terem de estar sentados muitas horas por dia. As pessoas sedentárias são como adictas: muitas têm problemas familiares, profissionais, ou problemas psicológicos próprios e então, “vingam-se” comendo. Por isso, para serem submetidas à cirurgia bariátrica, têm de passar pelo crivo de uma observação psicológica ou até psiquiátrica.

Que cuidados devem ser tomados após a cirurgia?
Após a cirurgia, o álcool e alimentos como a geleia, o chocolate, entre outros, têm de ser evitados. Para os pacientes que fazem esta cirurgia, o consumo de álcool é perigosíssimo e pode levar rapidamente a uma cirrose hepática, uma vez que este é absorvido quase directamente pelo organismo. Há casos de pacientes que, depois da cirurgia, transformam o seu adictismo, passando da comida para o álcool. Dai que seja muito importante a avaliação psicológica antes da cirurgia.




 


seara.com
 
2009 - Farm´cia Caniço
Verified by visa
Saphety
Paypal