DEZEMBRO 2023
O ALCOOLISMO é UM PROBLEMA DE SAúDE PúBLICA
Eduardo Lemos
Casa de Saúde São João de Deus
O alcoolismo é um problema de saúde pública

Compete à Casa de Saúde São João de Deus, a luta contra o alcoolismo na Madeira. Um problema que Eduardo Lemos considera “preocupante”, com “consequências” graves para a saúde. Taxa de sucesso nos primeiros 28 dias é de 85%. Cura só se consegue com abstémia.

A quadra natalícia, a entrada do Ano Novo e todas as festividades associadas como as missas do parto e os motivos festivos por toda a ilha, foram o motivo para a temática principal deste JM Saúde, com destaque para o trabalho incansável da Casa de Saúde São João de Deus.

Pela sua experiência, quais são as causas do alcoolismo? O que leva as pessoas a ficarem dependentes do álcool?
A Síndrome da Dependência de Álcool constitui uma problemática de considerável gravidade para a saúde pública dos cidadãos, das famílias e das comunidades que não podemos ignorar. O alcoolismo é um problema de saúde pública, digamos preocupante também na Região. O consumo excessivo de álcool tem consequências graves para a saúde, tanto a curto como a longo prazo e consome muitos recursos no tratamento, recuperação e reabilitação. Mas a não intervenção eficaz e atempada, significa custos ainda mais significativos, nomeadamente financeiros, para a própria comunidade. Não existe uma única causa ou razão que determina ou concorre para alguém se tornar alcoólico ou dependente do álcool como substância; numa análise mais transversal, podemos considerar vários fatores que muitas vezes, complexamente interligados, conduzem as pessoas para quadros de uso, abuso e dependência grave da substância álcool. Tais fatores são de natureza individual, ambiental, cultural, social, psicológico, até genético e biológico. As causas dos PLAs – Problemas Ligados ao Álcool são, pois, multifatoriais. Porém, é notório que ter familiares próximos ou de referência - mãe, pais, avós, com o problema, pode constituir-se como preditor para tornar-se dependente. A pressão social, acontecimentos negativos marcantes que causam desconforto impressionante, ansiedade, o isolamento social, a influência do grupo de pares, constituem aspetos que influenciam e determinam o início, o uso, aumento e abuso de consumos excessivos de álcool.

A Casa de Saúde trata diretamente os problemas de alcoolismo. Para o processo de cura, são os doentes que vos procuram? 
Para o processo de tratamento somos contactados de diversas formas. Podemos considerar que atualmente contamos com uma boa rede de parceiros que trabalham em conectividade, com boa interligação, como sejam os serviços do SESARAM (Centros de Saúde, Serviço de Urgência, Unidade de Psiquiatria do Hospital), outras entidades nomeadamente, Associação Protetora dos Pobres, Associação Anti-alcoólica da Madeira, órgãos de poder autárquico, sector empresarial. De realçar o programa de seguimento pós-alta da Casa de Saúde, que monitoriza os processos de recuperação e reabilitação das pessoas que cumprem o programa de tratamento, onde os utentes que já tenham realizado um tratamento no passado, em fase de recaída, tenham a possibilidade de fazer novo programa de reabilitação. 

Quais são as consequências fisiológicas e sociais do álcool?
O álcool está associado como um fator causal de muitas enfermidades e representa mundialmente a causa de morte de inúmeras vidas por ano. Trata-se de uma substância psicoativa que afeta todos os nossos sistemas orgânicos com maior ênfase no sistema gastrointestinal, cardiovascular e neurológico. A nível social o álcool está associado a perda de emprego, habitação, a conflitos e disrupção familiar, a acidentes rodoviários e a violência seja ela doméstica ou pública. 

Quantos doentes estão internados e em tratamento na Casa de Saúde? 
Na casa de saúde a unidade para tratamento de alcoologia S. Ricardo Pampuri tem 31 camas, sendo que a ocupação varia com a mobilidade de altas e as novas entradas de pessoas com a problemática, mas mantendo um nível de ocupação superior aos 90%. Na presente data temos a unidade com 100% de lotação e 270 internamentos no corrente ano. De realçar a capacitação da unidade em satisfazer todas as necessidades regionais em matéria de tratamento, significando que não há listas de espera para os utentes terem a oportunidade de efetuarem um tratamento especializado, numa unidade de intervenção com certificação internacional. 

É possível dizer-se que há uma recuperação plena? 
Embora o alcoolismo seja uma doença crónica, tal igual à diabetes, hipertensão arterial, entre outras, a recuperação plena é possível através de um processo continuado de atenção, sobretudo adotando comportamentos cuidativos e preventivos no que respeita à gestão dos lapsos e recaída nos consumos. Mas é claro e inequívoco que é possível e desejável as pessoas viverem uma vida plena e saudável após o tratamento, sendo que, para tal, é pois necessário a manutenção da abstinência alcoólica, que será facilitado com o apoio familiar e dos serviços de saúde e sociais, nomeadamente aqueles oferecidos pela Casa de Saúde. 

Quais são os tratamentos/abordagens para a cura do consumo do álcool? 
O tratamento realizado na casa de saúde para pessoas com Problemas Ligados ao Álcool comporta várias abordagens, nomeadamente de psico-educação, psicoterapia, dinâmicas de grupo, estimulação cognitiva, reeducação social, terapia medicamentosa, programa de seguimento pós alta. Para dar resposta a esse tratamento dispomos duma equipa multidisciplinar constituída por enfermeiros, psiquiatras, psicólogos, assistente social, educadora social, gastroenterologista, professor, assistente espiritual, animadores voluntários, entre outros. 

Qual é a taxa de sucesso da realidade regional? 
A taxa de eficácia do tratamento (taxa de abstinência) nos doentes à saída do tratamento que compreende um espaço temporal de 28 dias é muito elevada, situando-se nos 85%, o que significa que uma larguíssima maioria das pessoas internadas conseguem cumprir o tratamento até ao seu términus e simultaneamente cumprir eficazmente o seu propósito e objetivos delineados que diz respeito à abstinência total. Na continuidade da monitorização e controle do processo individual de reabilitação, as pessoas em programa de seguimento pós alta também é elevado e muito promissor. 

Álcool e Suicídio 
O consumo excessivo de álcool, padrões de consumo abusivos, estão marcadamente correlacionados com a ideação suicida e consumação de suicídios. O estado de embriaguez prejudica de forma muito substantiva e grave a capacidade e de análise, avaliação e a capacidade critica e seu controle, com perda da inibição, levando com frequência a ideias e atos de autolesão, nomeadamente o acometimento de suicídio, muitas vezes por enforcamento e intoxicação grave e aguda por substâncias exógenas e de alto teor de perigosidade. Nos doentes internados é percetível esta vulnerabilidade interna da pessoa e carece uma atenção e cuidado particular da equipa de saúde no sentido do diagnostico precoce, o tratamento atempado e a sustentação da sua recuperação futura. 

Álcool e Prevenção 
De considerar a importância do investimento em planos de prevenção do alcoolismo, como programas de educação para jovens sobre os riscos do alcoolismo e programas de apoio a pessoas que sofrem de alcoolismo que felizmente estão a merecer um cuidado diferenciado e substancial na Madeira. De facto, é muito importante prover os recursos e programas necessários ao tratamento, recuperação e reabilitação das pessoas que no seu percurso de vida tornam-se dependentes do álcool, até para minimizar os impactos económicos, sociais, psicológicos e mentais, mas também financeiros que acarretam para a comunidade madeirense; Não obstante, é fundamental intervir na prevenção primária da problemática, evitando o aparecimento e crescimento do problema. 

 


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