Dra. Mara Abreu
Psicóloga Educacional
Diretora do Eu'génio Centro de Aprendizagem
Porque a Alícia ficou mais um ano na pré
As crianças mais novas em cada turma estão em desvantagem em relação aos seus
colegas mais velhos pois têm: maior probabilidade de obterem piores resultados
académicos; de necessitarem de serviços de educação especial; maior probabilidade
de receberem um diagnóstico de hiperatividade e défice de atenção ou de
precisarem de apoio psicológico.
Enquanto mãe de uma criança
nascida em outubro, e portanto
condicional, fui confrontada com
uma escolha que, para mim, é bastante complexa: matricular a minha filha no 1.° ano com 5 anos ou
mantê-la na pré por mais um ano.
Digo que é uma decisão complexa
pois implica colocarmos em perspetiva não só o presente, mas sobretudo o futuro dos nossos filhos. É uma
escolha difícil cuja responsabilidade
é dos pais mas que deve envolver
as pessoas que melhor conhecem
os nossos filhos.
Por isso, em primeiro lugar, ouvimos a educadora no final do primeiro trimestre do ano, cujo parecer
era favorável à transição para o 1.°
ciclo. De acordo com a educadora, todos os pontos fundamentais
que permitem concluir que a criança está apta para transitar para o
1.° ciclo tinham sido atingidos e ao
longo do ano seriam trabalhados
conteúdos que iriam reforçar esta
preparação, para uma etapa escolar tão importante. No entanto, a
educadora salientou algumas questões relacionadas com a regulação
emocional, que também eram uma
preocupação nossa e que, acabaram por ter um peso maior na decisão do que outro tipo de questões
como: já saber contar, reconhecer
letras, números, contar histórias,
resolver problemas de matemática
simples, entre outros.
Em segundo lugar, à medida que
o ano avançava fomos conversando
com a nossa filha e percebemos que
havia um grande desejo em aprender mais, mas também, e sobretudo, uma vontade de continuar a
brincar, de praticar exercício físico
e explorar o desenho e a pintura.
No entanto, o desejo maior era: ser
finalista tal como os seus colegas.
Pouco tempo depois, começaram
os preparativos para a festa final da
escola, momentos especiais para os
finalistas e a viagem de finalistas. É
claro que enquanto mãe desejava
que a minha filha acompanhasse
o grupo, é o que todos desejamos,
verdade? Mas, eu e o pai, ainda não
tínhamos decidido se efetivamente
aquele seria ou não o seu ano de finalista. Por fim, fui pesquisar e perceber o que diz a ciência sobre este
assunto. Há poucos anos, o Centro de Investigação e Intervenção
na Leitura do Instituto Politécnico
do Porto (IPP) realizou um estudo
com 698 crianças portuguesas concluindo a inexistência de impacto
da variável idade nas competências
de base à aprendizagem da leitura.
Por outro lado, verificámos que os
países da Europa que apresentam
melhores resultados são aqueles
em que as crianças ingressam na
escola aos 7 anos como por exemplo a Finlândia ou a Suécia. Então
em quê que ficamos? Noutros estudos verificou-se que as crianças
mais novas em cada turma (isto é,
as crianças que nascem nos últimos
meses do ano) estão em desvantagem em relação aos seus colegas
mais velhos pois têm: maior probabilidade de obterem piores resultados académicos; de necessitarem
de serviços de educação especial;
maior probabilidade de receberem
um diagnóstico de hiperatividade e
défice de atenção ou de precisarem
de apoio psicológico. Parece-me
então que há mais vantagens em
deixar ficar mais um ano na pré. E
foi isso que fizemos. Para mim, faz
sentido contribuir para uma transição harmoniosa para o 1.° ciclo e
não um esforço para acompanhar
os colegas. Faz-me sentido, pensar
no futuro, nas vantagens de ser das
mais velhas do grupo numa fase
tão desafiante como a adolescência. Por tudo isto, decidimos que o
importante é permitir que a nossa filha tenha a oportunidade de
usufruir da sua infância em pleno
enquanto ainda é possível. Que possa ultrapassar desafios relativos à
gestão das suas emoções e fazer
novos amigos. É de salientar que a
escola contribuiu muito para que a
nossa filha, tal como outros colegas
que ficaram mais um ano no ensino
pré-escolar, não se sentissem tristes por não ingressarem no 1.° ano.
Todos participaram nas festividades
dos finalistas, cada criança com um
papel de destaque único e especial.