ABRIL 2010
HIGIENE íNTIMA
Dra. Eleonora Morais - Farmacêutica*
eleonora.morais@farmaciadocanico.pt

No contexto deste artigo, a expressão “higiene íntima”  pretende representar o conjunto de acções e comportamentos quotidianos  que visam a manutenção do estado de saúde dos orgãos genitais externos dependente dos hábitos de limpeza. Embora desaconselhados pela generalidade dos profissionais de saúde, muitas pessoas continuam a entender a higiene íntima como a prática de duches vaginais, com recurso a soluções assépticas que são irrigadas na vagina.

A higiene íntima pressupõe a utilização de agentes de limpeza não agressivos e apropriados às características da mucosa vulvovaginal – distintas das da restante superfície corporal - , à altura do ciclo menstrual e à idade reprodutiva da mulher, destinados a ser aplicados exteriormente.

Características da mucosa vaginal

Para a escolha do produto de higiene íntima, é essencial conhecer as características do ambiente genital. Como variam ao longo do ciclo menstrual, ao longo da vida da mulher e como se alteram face a algumas situações específicas.

A primeira defesa dos órgãos genitais e uma das mais importantes, é a sua flora natural. Esta flora corresponde a um conjunto de fungos e bactérias, em equilíbrio dinâmico entre si e o nosso sistema imunitário, que visa impedir a colonização do ambiente genital por microorganismos patogénicos e respectivo desenvolvimento, evitando que se instale uma infecção. Quando este equilíbrio da flora vaginal é perturbado, a mulher fica mais exposta às infecções vaginais. Por outro lado, a própria flora pode, em dado momento, tornar-se patogénica quando um determinado microorganismo não encontra oposição – por outros microorganismos ou sistema imunitário – ao seu desenvolvimento.  É o que acontece, com alguma frequência, na toma de antibióticos, em que que não só as bactérias patogénicas alvo são destruídas mas também as bactérias que constituem a flora natural, proporcionando o crescimento exagerado de um fungo – Candida –, o que se traduz pela instalação de uma infecção fúngica.

Um desequilíbrio da flora vaginal é, muitas vezes, consequência da má escolha do produto de higiene ou de lavagens excessivas. Tanto a primeira como a segunda situação podem levar a uma remoção exagerada da flora vaginal e dos agentes hidratantes da mucosa, originando um desequilíbrio mais ou menos severo que se traduz, em muitos casos, por uma infecção.

Outra característica muito importante do ambiente vulvovaginal é o seu pH. Um erro comum é a partilha do mesmo produto de higiene íntima por mãe e filha. Acontece que o pH da mucosa vaginal até à puberdade e depois na menopausa é próximo de 7 (neutro) e na puberdade e ao longo da idade fértil até à menopausa varia entre 3.8 e 4.2 (ácido) – devido ao ácido láctico produzido pelos bacilos de Doderlein – que impede o crescimento exagerado da flora vaginal e a colonização de patogénios. A escolha de um produto que promova a manutenção do pH vaginal é muito importante, seja para evitar inflamações da mucosa (o que se verifica na utilização de produtos de pH ácido em crianças e mulheres na menopausa) ou possíveis infecções.

Finalmente, é na vagina que se encontra a maior concentração de glândulas sebáceas – glândulas responsáveis pela produção e excreção de sebo. O sebo excretado tende a depositar-se nas pregas da mucosa vaginal, favorecendo a colonização bacteriana e posterior formação do odor desagradável. Uma boa higiene íntima vai remover o excesso destes resíduos sem, no entanto, levar a um desequilíbrio nas proporções dos microorganismos constituintes da flora vaginal.
 
Escolha dos produtos de higiene íntima

Os produtos utilizados para a higiene íntima visam promover a manutenção das características da mucosa vaginal – pH, secreções - evitando desequilíbrios da sua flora natural. Devem ter propriedades descongestionantes, tonificantes e calmantes.

O primeiro critério na escolha do produto de higiene é o seu pH, que deve ser o mais próximo do pH da mucosa vaginal. Assim, crianças e mulheres pós-menopausicas devem utilizar produtos com pH próximo da neutralidade; durante a puberdade e até à menopausa devem ser preferidos produtos com pH ácido próximo do pH vaginal. A manutenção do pH fisiológico vaginal é essencial para o equilíbrio da flora vaginal – primeira defesa contra agentes patogénicos.

Durante a menstruação, pode ser útil incrementar as medidas de higiene sem, no entanto, cair em exageros. A muda do penso higiénico ou do tampão deve ser frequente e sempre acompanhada de uma boa higienização das mãos. A limpeza com o papel higiénico (ou no duche) deve ser feita sempre no sentido da frente para trás de modo a evitar o arrastamento de bactérias fecais - provenientes do intestino – do ânus para a vagina ou uretra, facilitando infecções vaginais ou urinárias, respectivamente. É altamente aconselhável a utilização de água corrente.

Formulações líquidas acondicionadas em recipientes fechados são preferíveis. Os sabonetes ficam mais expostos a poeiras e outro tipo de sujidade e, por outro lado, a sua partilha aumenta o risco de contaminação. Note-se que os sabonetes tradicionais têm um pH alcalino – desde logo agressivo para a mucosa vaginal – e têm um poder detergente elevado, removendo em excesso as secreções naturais da mucosa vaginal, pelo que a sua utilização não tem vantagem.

O que se deve evitar

Pelo acima exposto, devem ser evitados produtos com sabão. Produtos com perfume, desodorizantes ou de irrigação vaginal estão desaconselhados. São demasiado agressivos, provocando reacções inflamatórias locais, alergias e desconforto. No entanto, continua a verificar-se que muitas mulheres recorrem a anti-sépticos por receio de maus odores e infecções ou por confundir o odor característico da mucosa vaginal – consequência da elevada concentração de glândulas sebáceas – com o odor de uma infecção.

Deve optar-se por roupa interior de algodão e pouco apertada. A utilização de pensos diários pode ter um efeito contraproducente. O aumento da humidade e da temperatura causadas pelo penso pode favorecer um desequilíbrio na flora vaginal e consequente infecção. Além disso, as próprias fibras do penso, em mulheres mais sensíveis, podem ser agentes de irritação local e alergia.

* Colaboradora da Farmácia do Caniço desde 2008.


 


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