Dra. Ermelinda Alves Médica Responsável pela Consulta de Cessação Tabágica do Centro de Saúde do Bom Jesus lindapalves@hotmail.com Tendo em conta que em Maio se celebra o Dia Mundial da Luta Contra o Tabaco, a Região tem uma estimativa da percentagem de madeirenses que fumam? Essa percentagem é semelhante ao que se regista no continente português? De acordo com dados publicados pela Direcção Geral de Saúde no documento “Portugal, Prevenção e Controlo do Tabagismo em Números – 2013” , a percentagem de fumadores e ex-fumadores na população com idade igual ou superior a 15 anos, ambos os sexos, é a seguinte: Portugal, 20,9%; RAM, 21,9%. Portanto, uma percentagem de fumadores ligeiramente superior à média nacional. Considerando a mesma população ≥ 15 anos, ambos os sexos, a percentagem de ex-fumadores é a seguinte: Portugal, 16,0%; RAM, 8,0%. Também de acordo com os dados publicados no documento atrás referido, a percentagem de alunos do 3.º ciclo com consumo de tabaco nos últimos 12 meses na RAM (analisando a evolução registada entre 2006 e 2011), aumentou de 30% para 38%. Quanto à percentagem de alunos do ensino secundário com consumo de tabaco nos últimos 12 meses, (comparando 2006 e 2011), verifica-se que na RAM aumentou de 40% para 47%. Estas variações apontam para a necessidade de se ter de fazer um maior esforço junto da população escolar no sentido de travar e inverter este crescimento do consumo de tabaco entre os jovens. Referiria ainda dois aspectos interessantes. No todo nacional o consumo de tabaco é mais elevado entre as pessoas com mais dificuldades económicas (26%) comparativamente às pessoas que não referem essas dificuldades (18%). Por outro lado, a maior prevalência de fumadores observou-se no grupo etário dos 35 aos 44 anos, em ambos os sexos (44,5% nos homens e 20,9% nas mulheres). A percepção de senso comum aponta para que é muito difícil deixar de fumar. Pela vossa experiência, porque é que isso acontece? Na verdade uma pequena percentagem de fumadores é capaz de manter níveis muito baixos de consumo e deixar de fumar com muita facilidade. Mas a grande maioria enfrenta sérias dificuldades quando tenta parar de fumar. Porque tratando-se de um hábito com dependência física e psíquica, os sintomas de privação do tabaco em regra não se conseguem ultrapassar sem ajuda. Apenas cerca de 3% dos fumadores conseguem deixar de fumar sem ajuda profissional especializada. O tabagismo é uma dependência e o fumador deve ser tratado como um dependente de uma substância psicoactiva, neste caso a nicotina (e muitas outras que estão presentes no cigarro). A paragem do consumo de tabaco e a diminuição da nicotina presente no organismo causa a síndrome de abstinência, que se inicia poucas horas após a cessação. Essa síndrome é caracterizado pelo desejo intenso de fumar, agressividade, instabilidade e dificuldade em se concentrar. Mas para além da dependência física existe a dependência psicológica. Como o acto de fumar está associado a diversas rotinas ou comportamentos (por exemplo, tomar café e fumar, ligar o computador e fumar, tomar uma bebida e fumar, sair à noite e fumar, etc.) o desejo de fumar é potenciado por essas associações automáticas. Por isso, quanto maior for a dependência da nicotina e quanto maior for a dependência psicológica mais difícil é para o fumador libertar-se do tabaco e mais difícil é o tratamento. O segredo do sucesso está em o fumador assumir que o tabagismo é uma doença, que provavelmente haverá recaídas ao longo do processo de tempo de tratamento, que pode levar meses, mas que vale a pena o esforço. Mas a ideia principal que se deve reter é a seguinte: apesar das dificuldades, com determinação e força de vontade do fumador e com a ajuda terapêutica adequada, qualquer fumador pode deixar de fumar! E vale mesmo a pena deixar de fumar. Em primeiro lugar, por uma questão de saúde. Parar de fumar diminui o risco de morte prematura. Os ex-fumadores vivem em média mais anos do que os fumadores e reduzem o risco de virem a sofrer de uma doença cardiovascular, de cancro ou de doenças respiratórias graves e incapacitantes. Vale a pena parar de fumar em qualquer idade. Mas é claro que os benefícios são tanto maiores quanto mais cedo se parar de fumar. Basta recordar os seguintes benefícios: • Após oito horas, os níveis de monóxido de carbono no organismo baixam e os de oxigénio aumentam. • Passadas 72 horas, a capacidade pulmonar aumenta e a respiração torna-se mais fácil. • Com cinco anos de abstinência do tabaco, o risco de cancro da boca e do esófago é reduzido para metade. • Ao fim de dez anos o risco de cancro do pulmão é já metade do verificado em fumadores, e o risco de se ter outros cancros diminui consideravelmente. • E após 15 anos de abstinência o risco de doença cardiovascular é igual ao de um não fumador do mesmo sexo e idade. Sem esquecer a aparência renovada, o hálito mais fresco, a redução do envelhecimento precoce e a poupança económica, que parar de fumar causa. Os madeirenses têm vindo a reduzir o consumo do cigarro? As campanhas que são desenvolvidas nesse sentido têm resultado? Em geral tem-se observado uma tendência de diminuição de consumo nos homens e de aumento nas mulheres. Dados relativamente recentes indicam que cerca de 32% dos homens e 14% das mulheres (população com mais de 15 anos) serão fumadores. É por isso necessário continuar a apostar na educação para a saúde e na prevenção do consumo de tabaco. Assim como é necessário aumentar a oferta de consultas de cessação tabágica nos centros de saúde da RAM de modo a cobrir todos os concelhos. É conhecida a percentagem de madeirenses que acabam por ter problemas de saúde mais graves como consequência do consumo do tabaco? Desconheço dados exactos sobre a percentagem de madeirenses que acabam por ter problemas de saúde mais graves como consequência do consumo do tabaco. Mas posso dizer que segundo estimativas da OMS para o ano de 2004, considerando a população portuguesa com idade igual ou superior a 30 anos, cerca de 1 em cada 10 mortes e cerca de 1 em cada 4 mortes, no grupo etário dos 45-59 anos, foram atribuíveis ao consumo de tabaco. Na União Europeia o tabaco mata por ano cerca de 700.000 pessoas. Em Portugal, estima-se que o tabaco tenha sido responsável, em 2012, pela morte de cerca de 10.600 pessoas. Se extrapolarmos este valor nacional para a RAM, então teremos cerca de 270 casos por ano. Estima-se que (WHO, 2012), em 2004, o consumo de tabaco tenha sido responsável, na população adulta portuguesa (≥ 30 anos), por cerca de: • 1 em cada 10 mortes; • 1 em cada 3 mortes por doenças respiratórias; • 1 em cada 5 mortes por cancro; • 1 em cada 10 mortes por doenças isquémicas do coração; • 17% do total de mortes no sexo masculino; • 3% do total de mortes no sexo feminino. O tabaco provoca efectivamente mortes prematuras. Esta realidade é bem mais evidente no grupo etário dos 45 aos 59 anos, grupo no qual, em 2004, cerca de 1 em cada 4 mortes verificadas foi provocada pelo consumo de tabaco (WHO, 2012). Mas a maior mortalidade atribuível ao tabaco foi observada nos homens com idade entre os 45 e os 59 anos. Vejamos alguns números assustadores: • 1 em cada 3 mortes; • 1 em cada 2 mortes por cancro; • 9 em cada 10 mortes por cancro da traqueia, brônquios e pulmão; • 1 em cada 2 mortes por doenças isquémicas do coração ; • 1 em cada 2 mortes por doença cardiovascular; • 1 em cada 2 mortes por doenças respiratórias; • 8 em cada 10 mortes por doença pulmonar obstrutiva crónica. Que mensagem gostaria de deixar aos fumadores crónicos? O consumo de tabaco rouba aos fumadores anos de vida saudável. E rouba-lhes muitos mais anos de vida. Uma vida sem tabaco é uma vida mais feliz. Os fumadores são capazes de deixar de fumar, mesmo os mais dependentes. E a presença de outras doenças (para além do tabagismo) é um factor adicional para tomar a decisão de deixar de fumar e procurar ajuda para isso. Nunca é tarde para parar. Por isso aos fumadores aplica-se muito bem aquele provérbio bem popular: não deixe para amanhã o que pode fazer hoje. Vale a pena deixar de fumar! |