JULHO 2012
PERTURBAçõES NO CRESCIMENTO

Existem vários factores que podem condicionar o crescimento, pelo que é necessário monitorizar de perto a evolução das crianças, de modo a actuar caso se verifique uma perturbação no crescimento. A Dra. Amélia Cavaco, Médica Pediatra, explica em entrevista como é feito este acompanhamento.

Que factores podem condicionar o crescimento de uma criança?
O crescimento rege-se por determinados factores, sendo condicionado por eles e pelo ambiente, e podemos ter pessoas com alturas e pesos consideravelmente diferentes, mas serem tidos como dentro da normalidade para esse indivíduo. Em relação a factores que possam levar a um atraso no crescimento estatural ou de peso, podemos considerar como mais importantes: a família (genética), a restrição de crescimento que possa ter havido durante o desenvolvimento intra-uterino, se a criança é portadora de uma doença crónica, se é portadora de uma doença endócrina ou sindromática e também consideramos cada vez mais a importância dos factores psico-sociais. Quando acompanhamos crianças nos orfanatos ou vítimas de restrições afectivas, verificamos que essas restrições também condicionam muito o seu crescimento. Quando elas depois são integradas numa família, que lhes dá estímulos e afectos, elas têm um desenvolvimento não só psíquico, cognitivo, mas também estatural. Portanto, para um crescimento harmonioso, também é muito importante que a criança se sinta protegida. 

O crescimento é igual para rapazes e raparigas?
Não, o crescimento faz-se de maneira diferente e, de resto, é por isso que temos curvas de crescimento completamente diferentes para os dois sexos nos três itens: estatura, peso e perímetro craniano. Para a estatura expectável, temos fórmulas adaptadas ao sexo da criança que têm em consideração a estatura do pai e da mãe. Grosso modo, com uma variação de 3cm a 5cm, para mais ou para menos, em adulto um rapaz terá o dobro da estatura que tem aos 2 anos e uma menina terá o dobro da estatura verificada aos 18 meses. Claro que isto não é rígido e tem de haver alguma flexibilidade, porque há outros factores que entram na equação, como sejam: hábitos de vida saudável, alimentação adequada, existência ou não de doença crónica, etc.

O que é que deve ser considerado um crescimento “anormal”?
Para avaliarmos o crescimento, recorremos a tabelas, que nos dão os chamados “percentis”. A nós pediatras, o que nos preocupa é se a estatura, o perímetro craniano ou o peso, oscilam de maneira exagerada. Pequenas flutuações nas curvas de crescimento, não têm qualquer significado. Agora, se a criança estava a crescer mais ou menos bem dentro do seu percentil e, de repente, tem “saltos”, tanto para cima como para baixo do expectável, temos de analisar com mais profundidade, uma vez que algo poderá não estar bem. Até agora, em Portugal temos estado a seguir as curvas de crescimento do Center for Disease Control and Prevention (CDC), dos Estados Unidos, que foram feitas para uma determinada população e em determinadas condições: para além de serem bebés saudáveis, eram alimentados com leite de fórmula. Portanto, é um grupo de uma determinada região e que condiciona as curvas de percentis para aquela população, mas que têm sido usadas transversalmente noutras populações e não é isso que pretendemos. Surgiram depois outras curvas, da Organização Mundial de Saúde (OMS), as chamadas curvas “Eurogrowth”, de certo modo similares a estas, mas feitas na Europa, não estando também generalizadas à população mundial. No entanto, há alguns anos, a OMS fez um estudo, abrangendo os cinco continentes, visando o crescimento das crianças desde o nascimento até aos 5 anos, alimentadas exclusivamente com leite materno até aos 4 meses e iniciando a diversificação alimentar a partir daí, mas continuando a tomar leite materno até aos 12 meses, e sendo saudáveis. Isto permitiu fazer a determinação de umas novas curvas de crescimento, muito mais uniformes. Estas curvas já foram adoptadas por alguns países e em Portugal, está previsto que isso venha a acontecer a muito curto prazo.

Que vantagens trazem as curvas da OMS?
Vão permitir ter percentis muito mais adequados à população. Por exemplo, aquele lactente que está agora no percentil 25, o que sugere que tem menos peso que o estimado para a sua idade, poderá passar eventualmente para o percentil 50, o que nos satisfaz muito mais em termos de crescimento. Convém esclarecer que o percentil não é uma média: estar no percentil 25, por exemplo, significa que, naquela idade, em cada 100 crianças existem 25 abaixo e 75 acima do seu peso ou altura. As novas curvas da OMS são universais para lactentes e crianças até aos 5 anos, dos cinco continentes, portanto, estão melhor adaptadas à realidade. Outra situação positiva é que, a partir dos 5 a 6 meses de vida, há uma desaceleração do crescimento na criança, que é fisiológica, e isto está incorporado nas novas curvas, ao passo que nas curvas do CDC, o ritmo de crescimento é constante, o que não corresponde ao que acontece biologicamente. Penso que será importante passarmos a trabalhar com as novas curvas, não só para os profissionais de saúde como também para as famílias.

Se um bebé nasceu prematuramente, é aplicada uma tabela diferente?
Sim, isso acontece porque se o bebé nasceu prematuro, perdeu a oportunidade, no tempo que lhe faltava, de crescer “in útero”, ainda numa fase de aceleração grande e em condições ideais. Por isso, sobretudo no primeiro ano, fazemos uma correcção da idade real que aquele bebé tem, para a chamada idade cronológica. Na idade real, ele será mais baixo e menos pesado do que o estimado para a sua idade, mas quando fazemos a correcção, ele aproxima-se muito mais do desejado. Sublinho que não é a mesma coisa nascer prematuramente com, por exemplo, 1200gr ou 1500gr, e esse peso ser adequado à idade gestacional, do que nascer com esse mesmo peso, e ser um recém-nascido de termo. Quando isto acontece, o bebé teve a chamada restrição do crescimento intra-uterino. Isso pode ter acontecido devido a várias situações: a mãe ser hipertensa, fumadora, toxicodependente, portadora de doença crónica, etc.

Qual a diferença no tratamento destas duas situações?
O bebé que nasceu no tempo certo, mas com menos peso que o previsto, não sofreu apenas em termos do seu peso, da sua estatura e do seu perímetro craniano: os seus órgãos também sofreram. Os rins têm menos nefrónios, o fígado também se adaptou a essa restrição de crescimento, bem como o intestino e os outros órgãos e sistemas. Isto leva a que as expectativas pós-natais tenham de ser completamente diferentes. Enquanto que o bebé prematuro nasceu com um peso baixo, mas adequado à sua idade gestacional, tem um crescimento rápido, ocorrendo aquilo a que nós chamamos de “catch-up growth”, este outro bebé tem de se adaptar a novas condições e não se pretende que tenha um crescimento muito rápido, porque metabolicamente vai sofrer, precisamente por não ter, por exemplo, nem os rins nem o fígado adaptados para grandes cargas metabólicas. Portanto, a velocidade de crescimento terá de ser mais lenta e as expectativas mais baixas.  

Em que consiste o “catch-up growth”?
O “catch-up growth” é um rápido crescimento no lactente, na criança que nasceu pequena para a sua idade gestacional, ou também que teve algum problema de saúde que veio limitar esse crescimento. Quando esse problema de saúde é resolvido, ela faz o seu “catch-up growth”. Isto nota-se, sobretudo, na criança que começa a desenvolver uma doença crónica e que, quando é tratada e fica com a sua situação clínica estabilizada, tem a oportunidade de dar um salto de crescimento. Quando a criança nasce prematura ou pequena para a sua idade gestacional, desejamos que este “catch-up growth”, se dê até aos 2 anos, sendo que, normalmente, é isso que acontece e até se dá habitualmente antes. 

Qual é a importância da medição do perímetro craniano?
A medição do perímetro craniano é muito importante: ele deve ser medido e monitorizado desde o crescimento até aos 2 anos. Podemos ter tamanhos abaixo do expectável, as microcefalias, que de um modo geral, têm causas genéticas ou sindromáticas, mas que, felizmente, não são muito frequentes, ou então podemos ter um perímetro craniano um pouco acima do expectável, o que não tem que ser, logo à partida, patológico. Temos de ver como é que a criança cresce, verificar se na família há pessoas com a cabeça grande, que nós chamamos macrocefalia, e que muitas vezes o recém-nascido e o lactente também têm, mas que depois se regulariza. Se tiver uma velocidade de crescimento regular e constante, e não em saltos, não nos preocupa, uma vez que o mais frequente é ocorrência da chamada macrocefalia familiar, que é benigna.

Qual a importância da alimentação no crescimento harmonioso?
Nunca é de mais referir que a alimentação deve ser diversificada e equilibrada. Também devem ser incentivados outros hábitos saudáveis, nomeadamente a prática de desporto logo que seja possível, e quando chegar à adolescência evitar comportamentos de risco, como o consumo de drogas, o álcool, o tabaco, etc. Tudo isto são factores que condicionam um bom crescimento.


 


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