MARçO 2012
SíNDROMES VERTIGINOSOS
Os síndromes vertiginosos podem ocorrer em qualquer altura da vida mas são particularmente perigosos após os 65 anos, devido ao aumento do risco de quedas. O Dr. Miguel Furtado, Otorrinolaringologista, explica em entrevista quais as principais causas dos síndromes vertiginosos e qual o tratamento mais adequado para cada caso.

Em que consistem os síndromes vertiginosos?
Para mantermos um bom equilíbrio, temos três órgãos receptores, que são o ouvido, a visão e a propriocepção, tendo este último a ver com a sensibilidade das articulações e da coluna, com uma certa sensibilidade postural. Depois, o cérebro gere toda a informação recebida destes órgãos e que executa o equilíbrio a nível muscular. Qualquer lesão ao nível dos ouvidos, na visão, a nível da propriocepção, do cérebro, ou a nível muscular, pode levar a problemas ao nível do equilíbrio, sendo que poderemos estar perante várias síndromes diferentes consoante a lesão. A primeira dificuldade ao nível do diagnóstico passa por saber qual destes órgãos está afectado. No entanto, a maioria dos síndromes vertiginosos partem do ouvido, porque no fundo é o único órgão do nosso corpo feito especificamente para o equilíbrio: metade do ouvido serve para ouvir e a outra metade para nos equilibrarmos. 

Que tipos de lesões podem provocar estes problemas?
Há várias lesões que podem afectar o ouvido na parte do equilíbrio. Temos, por exemplo, as vertigens posicionais paroxísticas benignas, mais conhecidas pela sigla VPPB. São das vertigens mais frequentes, ocorrendo essencialmente quando as pessoas atingem uma determinada posição, por exemplo ao deitar-se ou ao levantar-se. Dizem-se posicionais porque só ocorrem numa determinada posição, paroxísticas porque são imprevisíveis e benignas porque por detrás não está nenhuma lesão grave. Ocorrem devido à libertação de uns cristais dentro do ouvido que, ao atingir uma determinada zona, provocam um desequilíbrio de posição. No passado, a VPPB era confundida frequentemente com a patologia da cervical, uma vez que a vertigem era desencadeada quando as pessoas moviam a cabeça ou para cima ou para baixo. Temos também a Doença de Ménière, que é muito conhecida: o ouvido interno tem um líquido que, quando aumenta a sua pressão, provoca uma tontura, que aparece muito associada a uma diminuição da audição e a um zumbido. De resto, estes são os três sintomas que denotam o atingimento do ouvido interno: a vertigem, o zumbido e a diminuição da audição. Outra lesão frequente é a neuronite vestibular, que surge quando é atingido o nervo vestibular, que é aquele que leva a informação do ouvido interno ao cérebro, muitas vezes após uma gripe ou uma constipação. Existem também alguns tumores, principalmente tumores benignos, como o neuroma do acústico, que provocam diminuição da audição, zumbido e vertigem, e ainda alguns tumores cerebrais, essencialmente na zona do cerebelo, que também provocam problemas de equilíbrio. O cerebelo coordena a informação que vem da periferia para o cérebro e qualquer patologia que afecte esta zona pode ter um impacto a nível do equilíbrio, quer se trate de tumores da fossa posterior, quer de problemas vasculares.

Portanto, a doença vascular cerebral também pode levar a problemas do equilíbrio?
Pode, se essa doença vascular cerebral atingir as zonas do cérebro onde é recebida a informação que vem da parte periférica. Em cada ouvido interno temos cinco órgãos de percepção do equilíbrio: três canais semi-circulares que captam a informação angular (quando olhamos de um lado para o outro), e dois que captam a aceleração linear e a gravidade, respectivamente. Quando a nível central existe uma lesão vascular que afecta a zona onde é integrada toda esta informação, por trombose ou por insuficiência vascular, por não chegar sangue a essa zona, podem ocorrer perdas de equilíbrio. 

O diagnóstico dos síndromes vertiginosos é difícil, tendo em conta todas as possíveis causas? 
O meio de diagnóstico principal que utilizamos é a anamnese, a entrevista com o doente. Procuramos saber quando foi o primeiro episódio e o que é que o desencadeou, se tem a ver com movimentos da cabeça, se ocorreu em sítios com muito movimento, ao mudar de posição, ou se o doente tem outros sintomas associados, como diminuição da audição ou zumbidos. É preciso ver se o doente tem problemas a nível cardíaco, por exemplo, uma vez que um indivíduo que tenha anemia ou arritmias cardíacas também se poderá queixar de perdas de equilíbrio por má circulação a nível central. Temos de saber não só as características da vertigem como também sintomas associados, incluído ainda problemas articulares e visuais, porque como estes órgãos são utilizados ao nível do equilíbrio, qualquer lesão pode entrar no diagnóstico diferencial. Após a anamnese, se suspeitamos de uma doença da parte vestibular tanto periférica como central, temos alguns exames disponíveis para fazer o diagnóstico. Podemos começar por fazer exames de audição, nomeadamente o audiograma, o timpanograma e o estudo dos reflexos acústicos. Depois, temos um exame específico da função de equilíbrio, a videonistagmografia, e muitas vezes utilizamos também a posturografia, que nos permite ver qual a atitude que o paciente assume perante os equilíbrios. Também usamos instrumentos de diagnóstico de imagem, nomeadamente o TAC cerebral e a ressonância magnética nuclear. 

Existe alguma faixa etária que apresente maior risco?
Podem surgir problemas de equilíbrio em qualquer altura da vida, embora na infância sejam mais raros que na idade adulta. O que verificamos é que as pessoas mais velhas que têm problemas ao nível do equilíbrio frequentemente apresentavam uma certa intolerância ao movimento quando eram crianças, por exemplo sentindo-se mal dispostas ao viajar no assento de trás do carro – isto é algo que denota uma certa sensibilidade ao nível do ouvido. Apesar de poder afectar pessoas de qualquer faixa etária, a vertigem é muito mais frequente a partir dos 65 anos, tendo uma origem multi-factorial, uma vez que todos os órgãos que gerem o equilíbrio se vão deteriorando com o passar dos anos: a parte visual, osteomuscular, o ouvido, a coordenação motora, os músculos, a parte cerebral, que fica um pouco mais lenta, ocorrem mais problemas a nível circulatório, etc.. O grande problema do desequilíbrio a partir dos 65 anos tem a ver com as quedas, o que não se coloca tanto nas faixas etárias mais jovens porque as pessoas ainda têm uma boa mobilidade e quando perdem o equilíbrio, conseguem ter atitudes defensivas para corrigir essa situação. Existem várias formas de defesa face ao desequilíbrio: com movimentos do tornozelo, de anca, ou então com um passo em frente, dependendo da intensidade desse desequilíbrio. A pessoa mais idosa pode ter mais dificuldade em colocar estas defesas em prática, acabado muitas vezes por cair.  Após os 65 anos, são mais comuns as queixas de instabilidade, de uma certa intolerância aos sítios com muito movimento, fazendo com que os indivíduos adoptem uma marcha defensiva, porque facilmente se desequilibram.

Quais os perigos associados aos síndromes vertiginosos? 
Para determinadas actividades e profissões, as vertigens são perigosas: estou a pensar, por exemplo, nos indivíduos que trabalham na construção civil. A nível da condução, também se podem colocar problemas, nomeadamente em zonas de grande movimento, uma vez que ao enfrentar movimentos tanto da esquerda como da direita, os doentes podem ter uma situação de vertigem acentuada. Para além disso, a vertigem está associada à ansiedade: as pessoas que sofrem de vertigens sentem insegurança e ficam ansiosas facilmente, o que pode ser perigoso ao volante. Por esse motivo, muitas vezes recomendo aos pacientes que não conduzam em sítios movimentados. Hoje em dia, tem-se vindo a tornar cada vez mais frequente uma outra situação: as pessoas que passam muitas horas em frente ao computador chegam por vezes ao fim do dia com uma sensação de náusea e muito cansadas. Isto acontece porque o ouvido controla os movimentos oculares e quando existe patologia do ouvido, torna-se difícil seguir as imagens no computador. Estes casos não apresentam o mesmo grau de perigo que os exemplos anteriores, mas o cansaço tem um impacto negativo importante na vida das pessoas.

Quais são os tratamentos disponíveis actualmente para estas situações?
Quando estamos perante uma doença do ouvido, existem tratamentos medicamentosos e tratamentos de reabilitação vestibular. O tratamento medicamentoso é feito com fármacos que melhoram o equilíbrio - em determinadas situações, como é o caso da Doença de Ménière, o doente terá de ser medicado toda a vida. Já no caso da VPPB, o tratamento não é medicamentoso, fazendo-se apenas com manobras de libertação, que visam recolocar as partículas do ouvido no sítio certo. Em algumas situações, também podemos recorrer à terapêutica cirúrgica, nomeadamente quando se encontrem pequenos tumores ao nível do nervo vestibular e a nível do ouvido, que provoquem tonturas. Sublinho que a parte do tratamento de reabilitação é muito importante, uma vez que temos de treinar os doentes a adoptarem posturas de equilíbrio e para isso existem exercícios de adaptação e de substituição. Por exemplo, quando o doente apresenta uma diminuição da função do ouvido e não é possível melhorar essa situação, temos de treinar esse indivíduo a adoptar uma postura em que utilize mais a sua visão e a sua propriocepção, de maneira melhorar o seu equilíbrio. 


 


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