FEVEREIRO 2012
A ACNE

A acne é uma doença da pele que afecta cerca de 85% dos adolescentes e cuja incidência na idade adulta tem vindo a aumentar. A Dra. Bárbara Pereira, Médica Dermatologista, defende que é uma doença que é importante tratar atempadamente, prevenindo desse modo cicatrizes. 

O que provoca a acne?
A acne é uma doença multi-factorial que afecta aquilo que cientificamente se descreve como a unidade pilo-sebácea, ou seja, a unidade que contém o folículo piloso, que é a estrutura que produz o pêlo, e uma glândula sebácea associada. Existem essencialmente quatro factores que estão na génese da acne: o primeiro é a alteração da queratinização do folículo – no fundo, é uma alteração da descamação das células ao nível do folículo, levando a uma obstrução, com retenção sebácea naquela zona; o segundo factor é o aumento da produção sebácea que ocorre em alguns períodos da vida, nomeadamente na adolescência; em terceiro lugar temos a proliferação de certas bactérias (em particular do Propionibactrium acnes) que, de resto, também se pode agudizar devido a este processo de retenção da secreção sebácea e de aumento dessa secreção; e finalmente, em quarto lugar temos os fenómenos inflamatórios associados à proliferação bacteriana e à ruptura da parede folicular. É importante perceber o que está na génese da doença, porque os tratamentos variam consoante o tipo de acne e o que se pretende é reverter todos estes processos. Há tratamentos que vão actuar num ou noutro destes pontos e outros que têm uma abordagem mais global. 
 

Hoje em dia, existe uma maior consciência de que é necessário tratar a acne?
A ideia de que a acne é uma doença que passa com o tempo, de que basta esperar para que passe, estará porventura relacionada com a sua frequência: estima-se que 85 por cento dos jovens entre os 12 e os 22 anos terá alguma lesão de acne, podendo ser esta mais grave ou mais ligeira. Isto é algo que poderá contribuir para a ideia de que a acne é uma coisa normal. Mas a realidade é que existe uma alteração do processo de saúde ao nível da pele. O não tratamento pode originar cicatrizes, que muitas vezes são definitivas e são muito mais difíceis de reverter numa fase tardia do que se forem tratadas logo ao início. A pele é um órgão como qualquer outro, e não podemos menosprezar a importância de tratar da sua saúde, uma vez que desempenha um papel importantíssimo, desde o revestimento do nosso corpo ao controlo da temperatura, sendo ainda um órgão muito importante nas relações sociais: quando as pessoas olham para outra, não estão a ver o coração ou os pulmões, mas estão a ver a pele, e isso é muito significativo socialmente, seja de uma maneira consciente ou inconsciente. Isto é válido não só para situações do foro pessoal, como também muitas vezes do foro profissional, o que lhe confere uma importância acrescida. Mas não é só uma questão de beleza, é uma questão de saúde: é preciso restituir a pele ao seu estado saudável. 

As pessoas que têm acne na idade adulta costumam ser reincidentes?
A acne é mais frequente na adolescência, mas tem-se vindo a verificar um aumento dos casos na idade adulta. Na adolescência, a incidência será mais ou menos equivalente em ambos os sexos (embora no caso dos homens com tendência para haver casos mais graves), mas na idade adulta, predomina mais no sexo feminino. Ainda não estão determinados com rigor todos os factores que estão a levar a esta tendência de aumento da incidência da acne na população adulta. Pensa-se que factores ligados ao estilo de vida – alimentação, stress, hormonas ambientais, utilização de contraceptivos, etc., poderão ter influência. Muitas vezes, pode haver persistência de uma acne que vem desde a adolescência, o que acontece sobretudo no sexo masculino. Já no caso do sexo feminino, é mais comum encontrarmos pessoas que tiveram acne na adolescência, depois tiveram períodos sem manifestações e mais tarde voltaram a ter acne, o que muitas vezes está relacionado com alterações hormonais. 

A acne pode deixar cicatrizes mesmo se as pessoas resistirem à tentação de espremer as borbulhas e os pontos negros?
O traumatizar as lesões vai aumentar a probabilidade de originar uma cicatriz, mas não é o único factor relevante. Existem lesões com fenómenos inflamatórios tão intensos que ocasionam, elas próprias, cicatrizes. Há pessoas que nunca espremeram uma borbulha e que têm cicatrizes numerosas e difíceis de reverter. Isto também depende do tipo de cicatriz: as cicatrizes quelóides, que são muito exuberantes e espessas, têm a ver com a natureza da pele, ou seja, há pessoas que terão propensão para ter esse tipo de cicatrizes devido ao seu tipo de pele e outras que não, independentemente de espremerem ou não as borbulhas. Outro ponto que convém esclarecer é relativo à alimentação, uma vez que a secreção sebácea é muito mais influenciada por outros factores, nomeadamente factores hormonais. Embora haja relatos de pessoas que dizem sofrer agudizações da acne se comerem alimentos específicos, como o chocolate ou gorduras, na realidade não há estudos que apontem nesse sentido para a população mais alargada. 

Que diferentes manifestações de acne existem?
Classificamos a acne consoante o tipo de lesões predominantes e dentro de cada tipo existem vários níveis de gravidade. Temos fundamentalmente três tipos de acne: a acne retencional, ou comedónica; a acne inflamatória, ou papulopustulosa; e ainda a acne nódulo-quística. A acne retencional verifica-se quando as lesões predominantes são provocadas pela retenção de sebo dentro do folículo, mas não estão inflamadas. Comedão é a designação científica para dois tipos de lesões: os comedões abertos e fechados. Os comedões abertos, ou pontos negros, surgem quando o folículo retém o sebo mas mantém a sua abertura, o sebo oxida e origina aquele material escuro. Quando o folículo retém o sebo, mas está fechado, origina umas lesões denominadas comedões fechados, que são saliências ao nível da pele e têm um aspecto mais esbranquiçado que o ponto negro. Ou seja, estes dois tipos de lesões são mais ou menos semelhantes, a diferença passa apenas pelo facto de o folículo estar aberto ou fechado. Já na acne inflamatória, ou papulopustulosa, predominam as lesões com inflamação significativa. As pápulas são borbulhas vermelhas, mas que não têm conteúdo de pus, enquanto aquelas que têm pus se denominam, do ponto de vista científico, de pústulas, sendo vulgarmente chamadas de “espinhas”. O terceiro tipo, a acne nódulo-quística, é o mais grave, uma vez que predominam lesões que, para além da inflamação, têm uma dimensão significativa. Os nódulos têm muitas vezes mais de 1cm de diâmetro e os quistos têm um conteúdo líquido. Este tipo de acne deixa muitas vezes cicatrizes que são difíceis de tratar. A classificação da acne tem a ver com o aspecto global, uma vez que, na maior parte dos casos, encontramos vários tipos de lesões na mesma pessoa.

Que tratamentos estão disponíveis para a acne?
Existem vários tipos de tratamentos: tratamentos tópicos e tratamentos sistémicos (em comprimidos). A sua utilização irá depender do tipo de acne e da sua gravidade. Em relação aos tratamentos tópicos, os retinóides são fundamentais no tratamento da acne. Estes medicamentos promovem a normalização da queratinização do folículo, ou seja, combatem aquele processo inicial que vai originar todas as lesões subsequentes de acne. Depois, temos também os antibióticos locais, que são usados sobretudo nas formas inflamatórias, em que existe uma proliferação de bactérias mais intensa. Outra substância que também é bastante usada no tratamento da acne é o peróxido de benzoílo, que tem uma actividade anti-bacteriana muito significativa, não sendo conhecidas resistências bacterianas, ao contrário do que acontece com os antibióticos. Temos ainda o ácido azelaico, que é uma substância que tem uma utilização mais secundária, mas que também é prescrita por vezes, sobretudo no caso da acne inflamatória. São fundamentalmente estes os tratamentos tópicos, sendo que, em muitos casos poderão ser usados mais que um em simultâneo. Por exemplo, está comprovado o benefício para o doente da associação de um retinóide com o peróxido de benzoílo, sendo esta uma abordagem um tratamento de primeira linha, por exemplo na acne pustulosa, que é a mais frequente. Relativamente aos comprimidos, temos os antibióticos orais, que actuam sobretudo nas formas em que há inflamação, devendo ser tomados por um período que varia entre 8 a 12 semanas, e depois temos a isotretinoína, o medicamento mais potente que existe actualmente para combater a acne, sendo aquele que é utilizado nos casos mais graves. É um medicamento muito eficaz, mas que exige um controlo médico apertado, porque tem efeitos secundários muito significativos, estando inclusivamente sujeito a legislação especial. Por exemplo, é completamente contra-indicado na gravidez, pelo que, para prescrever este medicamento a uma doente do sexo feminino em idade fértil, é obrigatório que ela faça contracepção oral, adicionando, de preferência, outro método contraceptivo, porque este medicamento provoca mal-formações nos bebés. Para além disto, a isotretinoína pode ter outros efeitos secundários ao nível do fígado, dos glóbulos do sangue, do colesterol, etc., o que faz com que a sua utilização tenha de ser muito bem monitorizada. 

Quanto tempo poderá demorar o tratamento?
Isso irá depender do tipo específico e da gravidade da acne de cada pessoa. Há pessoas cuja situação se consegue estabilizar em três meses e há outras em quem isso leva um ano, por exemplo. O tratamento tem de, necessariamente, contemplar duas fases: numa fase inicial, iremos procurar estabilizar a situação, e depois vai ser feito um tratamento de manutenção, que é fundamental. Um dos grandes erros que se cometem passa por tratar a fase aguda e quando as coisas melhoram, parar o tratamento. Isso só leva a que depois, ao fim de três ou quatro meses, o doente volte a estar como no início. O tratamento de manutenção tem de incluir um retinóide, que vai actuar sobre a queratinização. É preciso explicar ao doente que os retinóides não têm um efeito de melhoria imediata, pelo contrário, por vezes até há um período inicial em que os efeitos secundários surgem com mais intensidade. Os retinóides provocam a vermelhidão, descamação e secura da pele onde se aplicam. Estes efeitos surgem no início do tratamento, mas podem ser controlados e têm a tendência para diminuírem com o tempo. É por isso que é preciso explicar o processo logo à partida, para evitar que o doente, ao ver aquele efeito inicial, se sinta tentado a desistir do tratamento.


 


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