ABRIL 2011
“RAPIDEZ é FUNDAMENTAL NA RESPOSTA A PROBLEMAS CARDíACOS”
A elevada incidência de doenças cardiovasculares entre a população é preocupante e deve levar a um reforço da informação sobre esta problemática, defende o Dr. Jorge Araújo, médico cardiologista. No caso específico do infarte do miocárdio, a rapidez no acesso aos cuidados médicos é fundamental, adianta este especialista.

Quais são os principais factores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares?
Os factores de risco dividem-se em modificáveis e não modificáveis: os factores não modificáveis têm a ver com a nossa herança genética, dependendo dessa mesma herança a nossa maior ou menor propensão para desenvolver doença cardiovascular. Depois, temos os factores de risco modificáveis: o consumo do tabaco, a obesidade, o sedentarismo, o colesterol elevado, a hipertensão e a diabetes. Convém sublinhar que cerca de 30 por cento dos doentes que tratamos por angioplastia coronária, com síndromes coronários agudos, são diabéticos, pelo que estes doentes têm de ser seguidos com muito mais cuidado. As recomendações internacionais apontam para que um diabético tenha de ter uma tensão arterial e colesterol mais baixos que os não diabéticos assim como o controlo do peso tem de ser muito mais rigoroso, porque estes indivíduos têm intrinsecamente uma maior propensão para o desenvolvimento de doença arterosclerótica. Isto leva a que, em termos de prevenção, tenhamos de ser muito mais restritivos para com os diabéticos.

As estatísticas sobre as doenças cardiovasculares apontam para um crescimento forte da incidência nas últimas décadas. Vê esses números com preocupação?
Os números geram, de facto, alguma preocupação… Penso que estamos a fazer aquilo que deveríamos fazer em termos de informação, mas as pessoas provavelmente não estão a captar toda a mensagem que estamos a tentar transmitir. O último trabalho publicado EUROASPIRE III diz que temos tentado lutar contra alguns factores de risco no âmbito das doenças cardiovasculares, mas nem sempre estamos a conseguir levar à diminuição da incidência desses factores. O consumo do tabaco, por exemplo, não diminuiu, apesar de todas as campanhas que se têm feito e de medidas como a restrição de fumar em lugares públicos. Também não conseguimos diminuir a obesidade - pelo contrário, está a aumentar… A diabetes também está a aumentar e não estamos a conseguir controlar a hipertensão e colesterol até os níveis recomendados pelas guidelines internacionais. Ao nível da obesidade, é um facto que a mensagem não está a passar. Mas aqui, penso que estamos a lutar com armas “desiguais”, quando pensamos no marketing dos supermercados, das grandes cadeias de consumo alimentar, que tem superado aquilo que tem sido a nossa mensagem. Ou seja, quando as pessoas vão ao supermercado, são incentivadas a consumir determinadas coisas, que não são necessariamente as mais saudáveis, uma vez que os produtos não são colocados ao acaso. Estão perfeitamente estudados os padrões que levam a compras por impulso. Daí a colocação de chocolates e guloseimas junto às caixas, por exemplo. Enfim, tudo isto são factores que contribuem para que não estejamos a conseguir fazer passar esta mensagem de que as pessoas têm de controlar o seu peso e de fazer exercício físico. O mais preocupante é que estamos a perder esta batalha nas crianças: em Portugal, temos uma percentagem elevada de crianças obesas, ou pelo menos com excesso de peso, apesar de todos os programas que se têm feito ao nível das escolas, por exemplo.

Portanto, apesar de haver muita informação sobre saúde, não se está a conseguir provocar mudança de comportamentos?
Estamos a falar de uma mudança lenta e, apesar de estarmos a conseguir passar a mensagem em alguns aspectos, noutros não estamos a ter o mesmo sucesso. Mas não vejo outro caminho que não seja fazer passar ainda mais informação. As pessoas têm de saber o que é que lhes faz mal, mas tem de haver depois um nível de esforço individual. Nós podemos dizer: “deixe de fumar”, mas é o fumador que depois tem de tomar consciência que está a fazer algo que é mau para a sua saúde e que tem de parar. A prevenção divide-se em prevenção primária e prevenção secundária. A prevenção primária é dirigida aos indivíduos que não têm doença, enquanto a secundária é dirigida aos que já têm doença. Normalmente, é mais fácil fazer a prevenção secundária, porque quando a pessoa já está doente, tem mais consciência do malefício provocado pelo seu estilo de vida. Na prevenção primária, muitas pessoas pensam, antes de adoecerem, que a doença é só “para os outros”, o que manifestamente não é verdade. Penso que não devem ser só os profissionais de saúde a estarem preocupados com esta luta, entendo que o Estado também tem de se empenhar muito mais, visto que os ganhos em Saúde irão traduzir-se em ganhos orçamentais para o Estado.

As doenças cardiovasculares estão a aparecer em pessoas cada vez mais jovens…
Efectivamente, temos vindo a assistir a casos de síndromes coronários agudos em pessoas mais jovens. De momento, ainda não temos estatísticas fidedignas sobre o que se está a passar, mas está a ser feito um grande esforço no sentido de obtermos estes dados. O Serviço de Cardiologia do Hospital tem neste momento, e desde Janeiro de 2010, um registo (COLGE) das síndromes coronários agudos (SCA), que é feito à luz das novas normas de classificação dos mesmos. Claro que ainda não passou tempo suficiente desde o início do registo para que seja possível determinar uma tendência através do estudo dos dados, mas no futuro tenho a certeza que este vai ser um instrumento importante para compreendermos o que se está a passar aqui na Região.

Relativamente ao tratamento, que novidades merecem destaque?
Penso que ao nível dos cuidados, as coisas têm melhorado bastante, porque os tratamentos também têm evoluído. Falando da fase aguda do infarto, que é onde acontece a grande mortalidade, começou-se por descobrir drogas que reperfundizam as artérias que se fecham aquando do enfarte, com uma taxa de sucesso razoável. Aqui na Madeira, deu-se um grande salto qualitativo ao nível do tratamento nos últimos anos: desde 2008, temos no hospital uma equipa de prevenção, disponíveis as 24 horas do dia, para o tratamento da fase aguda do infarte do miocárdio. Hoje em dia, cerca de 90 por cento dos infartos são tratados na sua fase aguda por meios mecânicos. Ou seja, conseguimos abrir as artérias e através de balões e “stents”, deixá-las abertas e a reperfundirem o miocardio. O que é preciso é que as pessoas venham para o hospital em tempo útil, nomeadamente nas 12 horas após sofrerem o infarte, mas é evidente que, quanto mais cedo vierem, melhor.

A que sinais de alarme é que as pessoas devem estar atentas?
A dor do infarte, de uma maneira geral, é uma dor muito aguda. Podem ocorrer alguns casos incaracterísticos, mas o normal é a pessoa sentir uma dor no peito, uma sensação de peso muito grande, que às vezes irradia para os braços ou vai para as costas, e que é muito aflitiva. Agora, é preciso ter em conta que há pessoas que são mais sensíveis à dor e outras menos. Os diabéticos muitas vezes têm menos sensibilidade à dor e, por esse motivo, queixam-se menos. Depois, conforme a localização da artéria que fechou, também as características da dor podem variar. Por exemplo, nos infartos da coronária direita, por vezes as pessoas confundem a dor com um problema gástrico, uma vez que a coronária direita está situada sobre o diafragma. Muitas vezes, as pessoas vêm ao serviço de urgência e queixam-se de que têm uma dor no estômago e antes que se possa identificar que essa queixa não está relacionada com problemas gástricos, mas sim com um infarto, pode-se perder algum tempo. Os outros infartos, de localização anterior, são muito mais explícitos nos seus sintomas e são mais rapidamente tratados.

Em termos de exercício físico e da alimentação, quais os cuidados a ter?
Ao nível da alimentação, a nossa dieta tradicional, a chamada dieta mediterrânica, é comprovadamente, uma das melhores dietas, pelo que devemos insistir nela. Um dos problemas que temos hoje em dia é que, com o ritmo da vida moderna, as pessoas são obrigadas a comer fora de casa muitas vezes e isso faz com que lhes seja mais difícil controlar aquilo que comem, nomeadamente ao nível do excesso de gordura, ou de sal, por exemplo. No caso das crianças, o papel das escolas é muito importante em termos de garantir que têm uma alimentação saudável e equilibrada, mas o maior problema tem a ver com o que as crianças comem fora da escola… Em termos de exercício físico, o exercício mais saudável é a marcha. As pessoas devem andar cerca de uma hora por dia, umas quatro vezes por semana. Isto traz benefícios não só a nível cardiovascular, mas também a nível osto-articular. As pessoas mais jovens podem fazer outro tipo de exercícios, mais exigentes, mas a partir de uma certa idade, nomeadamente dos 40 a 50 anos, não devem fazer coisas complicadas: se andarem bastante já será muito bom – nunca menos de 30 minutos de cada vez. Claro que as pessoas também podem ir para o ginásio, onde podem seguir programas mais rigorosos e onde são acompanhados por profissionais qualificados. A natação também é um óptimo exercício, uma vez que mexe com muitos grupos musculares e em termos osteo-articulares traz ainda mais benefícios que a marcha. Resumidamente, houve um slogan duma campanha da Fundação Portuguesa de Cardiologia, que tem sido dos maiores baluartes da luta para a prevenção das doenças cardiovasculares em Portugal, que dizia:
“Mexa-se pelo seu Coração!”.

 


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