Dra. Cristiana Areias – Farmacêutica* cristiana.areias@farmaciadocanico.pt A medição dos índices de Lactato não é de prática comum sendo, precisamente por isso, desconhecida pelo público em geral. Na verdade, a medição de lactato (ou ácido láctico) só tem interesse do ponto de vista desportivo ou em casos clínicos graves, para avaliação da hipóxia celular (estado de oxigenação insuficiente nos tecidos). Todos sabemos que precisamos de oxigénio para viver, o que a maior parte das pessoas não sabe é o motivo para tal acontecer. Na verdade, o oxigénio (O2) é a molécula que usamos na reacção a partir da qual conseguimos obter energia útil, chamada respiração aeróbia. Esta energia é essencial nas mais variadíssimas funções: digestão, pensamento, inspiração/expiração, inclusive o esforço físico, enfim…tudo! Mas nem sempre conseguimos fornecer oxigénio suficiente às células para que exista a energia necessária às referidas funções. Felizmente, o nosso organismo possui a capacidade de contornar essa necessidade, produzindo energia na ausência de oxigénio a partir de uma reacção, a qual origina ácido láctico. Se esta via alternativa não existisse, o nosso corpo entraria em colapso muito facilmente em caso de exercício excessivo. No entanto, esta via alternativa tem custos: por um lado é uma reacção que fornece menos energia, por outro, produz acido láctico que, em grande quantidade, é tóxico para o organismo e dá-nos a sensação de corpo dolorido e fadiga muscular. Hoje em dia, sabe-se que esta via alternativa é feita em simultâneo com a via aeróbia, mesmo em músculos bem oxigenados, e que o ácido láctico, apesar de ser formado constantemente, também é eliminado à mesma velocidade, salvo em condições de exercício intenso, em que a eliminação não consegue acompanhar a produção do mesmo. Mais recentemente, o ácido láctico passou a ser visto com muito mais interesse sob o ponto de vista metabólico, uma vez que se descobriu que esta molécula, após ser produzida, pode ser metabolizada no fígado como glicogénio (fonte de armazenamento de energia) ou oxidada pelas fibras musculares em energia útil de forma imediata. Por outras palavras, o ácido láctico, após ser produzido, pode ser usado no organismo como combustível de forma muito rápida. Cerca de 25 por cento da eliminação de ácido láctico durante o exercício é feita às custas do metabolismo hepático na produção de energia. Tal eliminação evita que o sistema acumule quantidade elevada de ácido no sangue (acidose láctica). Além disso, a glicogénese no fígado, a partir do ácido láctico, é o principal meio de manter a quantidade adequada de glicose no sangue durante o exercício prolongado. Treino desportivo e ácido láctico Tendo em conta que a acumulação de ácido láctico dá ao atleta a sensação de fadiga muscular mais rápida, o desempenho desportivo está claramente comprometido com a acumulação de ácido láctico no organismo do desportista. O objectivo é, então, fazer um plano de treinos que permita diminuir a produção de ácido láctico e aumentar a sua eliminação durante as competições. A crescente capacidade das vias de eliminação do ácido láctico depende em larga escala do aumento da carga de ácido láctico em níveis bem elevados. O treino de alta intensidade maximiza as adaptações necessárias para aumentar a utilização de oxigénio. Este tipo de treino é importante porque quanto maior for a liberação de oxigénio nos músculos, menor será a dependência da quebra de açúcares em ácido láctico. Além disso, o aumento da capacidade circulatória irá acelerar a eliminação de ácido láctico por tecidos que podem eliminá-lo do sangue. O treino chamado cardiovascular (corrida, bicicleta, natação) prolongado parece aumentar a capacidade aeróbia das mitocondrias celulares e, consequentemente, diminuir a produção de lactato. A medição do lactato no sangue de um atleta antes e durante o treino pode dar informações importantes que poderão definir o tipo de treino, com vista à optimização dos resultados desportivos. * Colaboradora da Farmácia do Caniço desde 2009 |
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